Vamos falar hoje mais uma vez sobre a enxaqueca e disfunção temporomandibular, só que dessa vez vamos deixar a tarefa para um convidado especial. Vamos lá? (leia também o outro artigo publicado sobre o tema!)
A enxaqueca comum (Migrânea sem aura) é definida como uma cefaleia primária com ataques de 4 a 72 horas e caracterizada por dor pulsátil unilateral de intensidade moderada a grave, agravada pela atividade física de rotina e associada a náusea, fotofobia e / ou fonofobia.
A enxaqueca clássica (Migrânea com aura): crises recorrentes, com duração de minutos, de sintomas completamente reversíveis unilaterais visuais, sensoriais ou outros sintomas oriundos do sistema nervoso central, que geralmente se desenvolvem gradualmente e são habitualmente seguidos por cefaleia e sintomas migranosos associados.
Migrânea crônica: Cefaleia que ocorre em 15 ou mais dias/mês por mais que três meses, a qual, em ao menos oito dias/mês, possui as características de cefaleia migranosa.
Enxaqueca e disfunção temporomandibular
A associação da Enxaqueca e Disfunção Temporomandibular (DTM) tem sido bem descrita em contextos clínicos e em pesquisas populacionais.
Em relação aos Critérios de Diagnóstico da Pesquisa para Distúrbios Temporomandibulares (RDC / TMD) Eixo I, o distúrbio de dor miofascial (grupo I) e a doença de artralgia (grupo IIIa) podem estar presentes ao mesmo tempo, representando uma DTM mista. Distúrbios da dor miofascial e doença da artralgia são incluídos nos quatro diagnósticos de DTM que ocorrem com mais freqüência. ***
Estima-se que a prevalência de enxaqueca é de 58% em participantes que apresentam pelo menos 1 sintoma de DTM.
A dor relacionada a DTM é um tipo de dor Orofacial, sendo que, o tipo mais comum de orofacial é a dor de dente, relatada em média por 12,2% dos pacientes. Articulação temporomandibular (ATM) é relatada por 5,3%. A dor orofacial raramente parece ser uma queixa isolada. Mais 81% dos pacientes que relatam um quadro orofacial tinham outras fontes de dor além da sistema trigeminal, mas poucos pacientes mencionam outras fontes de dor. Condições que parecem coexistir com DTMs incluem fibromialgia (FM), síndrome de fadiga crônica, dor de cabeça, transtorno do pânico, distúrbio do refluxo gastroesofágico, síndrome do intestino irritável (SII), sensibilidade química e estresse pós-traumático.****
No ICD-3 há a classificação de tipo de Cefaléia secundária: Dor de cabeça ou dor facial atribuída a distúrbios do crânio, pescoço, olhos, ouvidos, nariz, seios nasais, dentes, boca ou outra estrutura facial ou cervical.
Subtipo: Cefaleia relacionada a Disfunção Temporomandibular.
Estima-se que a prevalência de enxaqueca é de 58% em participantes que apresentam pelo menos 1 sintoma de DTM.
As taxas de prevalência do diagnóstico de DTM variam de 53% a 87 % na enxaqueca sofre e é ainda maior na enxaqueca crônica (91%).
A maior prevalência de ambas as condições em comparação com participantes com dor de cabeça ou sem DTM reforça que a relação entre essas duas condições é bidirecional.
Além disso, há é uma sobreposição nas manifestações clínicas da enxaqueca e DTM, pois ambas incluem dor intermitente na cabeça e na face, com pico de prevalência ocorrendo em adultos jovens e de meia idade, preferencialmente em mulheres, com influência significativa do ciclo hormonal.
Os mecanismos que levam à sobreposição entre essas duas condições podem incluir fatores ambientais e genéticos compartilhados que envolvem processamento de dor nociceptivo anormal, o mesmo sistema nociceptivo e presença de doenças periféricas e sensibilização central.
De fato, acredita-se que a presença de DTM seja um fator de risco para a cronificação da enxaqueca.
Embora a DTM esteja associada a vários tipos de dor de cabeça, a enxaqueca é a mais associada.
Em um estudo transversal**, que objetivou descrever a frequência de diferentes gravidades dos sinais e sintomas de DTM em pacientes com enxaqueca e determinar a magnitude da associação da gravidade da DTM com a enxaqueca episódica e crônica em relação aos controles saudáveis.
Um total de 84 mulheres foram incluidas: 31 pacientes com enxaqueca episódica (5,9 ± 3,7 d / mês), 21 com enxaqueca crônica (20,4 ± 7,9 d / mês) e 32 mulheres saudáveis.
Os sinais e sintomas da DTM foram associados à enxaqueca independentemente da frequência.
A magnitude dessa associação foi significativamente maior em pacientes com enxaqueca crônica, mas não episódica.
E pacientes com enxaqueca crônica tiveram um risco três vezes maior de relatar sinais e sintomas mais graves de DTM do que participantes saudáveis.
Minha prática como Fisioterapeuta:
Tenho trabalhado com dores crônicas a pelo menos 17 anos, e de lá para cá muita coisa mudou. Antes a minha abordagem era muito ligada aos aspectos físicos, aspectos estruturais, o Modelo Biomédico era a minha referência.
Mas precisei “reconceitualizar” o que eu sabia de dor. Quebrar minhas crenças não foi nada fácil. E para isso, entender o Modelo Biopsicossocial foi fundamental nesta mudança.
Posso dizer que nós Fisioterapeutas precisamos ter um raciocínio científico para compreender a prática Baseada em Evidências. O nosso pensamento clínico para a tomada de decisão deve deve ser probabilístico.
O que é mais provável ter um efeito positivo no desfecho clínico do paciente (ex. dor e incapacidade)?!?!?!
Em um paciente de enxaqueca e/ou disfunção temporomandibular o que é mais provável que funcione?!?!?!
Referências:
(*) The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition, 2018.
(**) Lidiane Lima Florencio, MD, Anamaria Siriani de Oliveira, PhD, Gabriela Ferreira Carvalho, MD, Fabiola Dach, PhD, Marcelo Eduardo Bigal, PhD, César Fernández-de-las-Peñas, PhD, and Débora Bevilaqua-Grossi, PhD; Association Between Severity of Temporomandibular Disorders and the Frequency of Headache Attacks in Women With Migraine: A Cross-Sectional Study; Journal of Manipulative and Physiological Therapeutics, 2017.
(***) Alfonso Gil-Martınez, Gonzalo Navarro-Fernandez, Marıa Angeles Mangas-Guijarro, Manuel Lara-Lara, Almudena Lopez-Lopez, Josue ́ Fernandez-Carnero, and Roy La Touche; Comparison Between Chronic Migraine and Temporomandibular Disorders in Pain-Related Disability and Fear-Avoidance Behaviors; Pain Medicine 2017.
(****) Guidelines for Assessment, Diagnosis, and Management; The American Academy of Orofacial Pain, 2018.