Derivado do verbo em Latim tinnire (tocar), o termo zumbido refere-se a uma percepção consciente de uma experiência auditiva sem um estimulo externo, ocorrendo entre 10% a 15% da população adulta1,2. Um estudo da Inglaterra com 48.313 indivíduos mostrou que 2,8% destes relatou uma severidade moderada de irritação com o zumbido, 1,6% relatou irritação severa e 0,5% relatou a habilidade de levar uma vida normal severamente afetada1. Descubra a relação entre zumbido e dores de cabeça !

As experiências de zumbido são descritas normalmente como: apito, chiado, assobio, entre outros. Em alguns raros casos o zumbido pode ser percebido como algo mais complexo como vozes Dou músicas. Neste último caso, diferente das alucinações patológicas (em doenças mentais como esquizofrenia), essas vozes podem ser percebidas como ruídos, sem significado específico1.

O zumbido também pode ser classificado como “objetivo”, quando pode ser escutado por um observador, ou “subjetivo” (mais comum) quando escutado apenas pela pessoa com o sintoma1.

O zumbido subjetivo pode ter diversas etiologias, porém normalmente é multifatorial. Dentre esses fatores, os mais comuns são: perda auditiva, trauma por barulho (ex.: música altíssima) e fatores psicológicos (estresse, depressão e distúrbios de ansiedade)2.

O zumbido também pode ter sua origem associada a diversas fontes, como doenças otológicas (ouvido interno e vias auditivas), medicamentos ototóxicos como salicilatos (aspirina), antibióticos aminoglicosídeos (estreptomicina) e agentes anti-neoplásicos a base de platina (cisplatina)1.

Existem ainda os zumbidos que sofrem interferência direta do sistema somatossensorial (sistema que gera informação sensorial do corpo para o cérebro). Quando esse sistema está em predomínio, classificamos o zumbido como somatossensorial (ZS)2 ou ainda zumbido somático cervicogênico (ZSC) quando há predomínio de disfunção da coluna cervical3.

Pesquisas mostram que a mudança da percepção do zumbido pode ocorrer devido a estímulos como: contração muscular forçada da cabeça, pescoço e membros; movimentos dos olhos; pressão em pontos de tensão muscular (trigger points)4. Alterações da coluna cervical e região temporomandibular também influenciam a percepção do zumbido2.

A prevalência do ZS pode variar entre 12% a 43% dos pacientes com zumbido, dependendo do local pesquisado (nível de atenção primário ou terciário)2. Entre os pacientes de zumbido, estima-se que 36-43% sejam classificados como zumbido somático cervicogenico3.

 

Afinal, qual a relação entre zumbido e dores de cabeça?

 

Pezzoli, M. e colaboradores investigaram uma amostra com 1.251 pacientes mostrando uma alta prevalência de zumbido associado a dor de cabeça e dor facial. No entanto, o estudo percebeu que nesses pacientes, o zumbido estava mais associado à dor muscular e ao aumento da sensibilidade desses músculos (da região cervical e cabeça) do que às formas especificas de cefaleias (cefaleia tensional, enxaqueca) ou de disfunção temporomandibular5.

A associação do zumbido com a enxaqueca parece ocorrer quando há dor muscular envolvida5.

Outro estudo, de 2018 usando uma base de dados de uma asseguradora de saúde de Tawian, ao comparar um grupo de 1.056 pessoas com enxaqueca a outro grupo de 4.224 pessoas sem historia de enxaqueca (grupo controle), concluiu que a enxaqueca aumenta o risco de zumbido6.

No artigo intitulado “Tinnitus and Headach” (zumbido e dor de cabeça) de 2015, Langguth B. e colaboradores investigaram uma amostra de 193 pessoas com dor de cabeça e zumbido e observaram a associação de diferentes formas de dor de cabeça com o zumbido além da relação de lateralidade entre zumbido e dor de cabeça. Diferente dos achados de Pezzoli, este estudo observou o sintoma de zumbido associado à enxaqueca (44.6%), cefaleia tensional (13%) e a associação das duas (5.7%)7.

Em outro trabalho publicado em 2017, Langguth B. investigou a associação do zumbido com cefaleia e observou comprometimento na qualidade de vida dos pacientes que apresentavam os dois sintomas e altos índices de incapacidade nesses pacientes. Esse achado pode ser justificado pelo efeito somatório dos sintomas resultando numa maior degradação da qualidade de vida dessas pessoas8.

Este estudo também sugere que a dor de cabeça do lado esquerdo e bilateral pode aumentar a severidade do zumbido, piorar a qualidade de vida dessas pessoas e os sintomas de depressão, assim como aumentar a frequência do tratamento psiquiátrico8.

 

Zumbido tem tratamento?

 

Apesar do tratamento do zumbido ainda ser negligenciado por muitos profissionais, é importante e que todo paciente passe por uma avaliação multidisciplinar com otorrinolaringologista especializado em zumbido, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, dentistas e psicólogos4.

Dispositivos de enriquecimento sonoro do ambiente (gerador de som) e aparelhos auditivos (em casos de perdas auditivas e tolerância reduzida ao som), aconselhamento, terapia cognitiva comportamental, musicoterapia, terapia de habituação ou TRT (Tinnitus Retraining Therapy), acupuntura, estimulação magnética transcraniana, mindfulness são alguns tratamentos comumente indicados9.

Nos casos somatossensoriais, exercícios para relaxamento dos músculos cervicais e mandibulares, desativação de pontos gatilho (trigger point) miofasciais, terapia manual, estimulação elétrica nervosa transcutanea (TENS), toxina botulínica tipo A, terapia por laser de baixa potencia e hipnose são alguns dos tratamentos que podem ser indicados dependendo da necessidade de cada paciente4.

Fisioterapia pode tratar zumbido?

Assim como o tratamento fisioterapêutico pode auxiliar nas dores de cabeça, também é muito útil em casos de zumbido. Apesar do tema zumbido ainda ser uma área pouco conhecida por muitos fisioterapeutas, vem ganhando a atenção progressiva desses profissionais devido à alta prevalência de zumbido somatossensorial3. Por esse tipo de zumbido estar fortemente associados a distúrbios neuromusculoesqueléticos, a fisioterapia tem inúmeros recursos para seu tratamento.

Devido a grande variedade de recursos terapêuticos disponíveis, é preciso considerar que a avaliação e o raciocínio clínico bem estruturado são componentes fundamentais no processo de escolha desses recursos terapêuticos, juntamente com o conhecimento das melhores evidências científicas disponíveis no momento.

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Quais são os melhores recursos fisioterapêuticos baseado em evidências científicas?

 

Um estudo clínico com alto grau de controle metodológico, feito em 2016, pela pesquisadora Belga Sarah Michiels e seus colaboradores, avaliou e tratou 38 pacientes que apresentavam zumbido subjetivo e severo, com queixas cervicais. Esses pacientes classificados com zumbido somático cervicogênico foram tratados com um programa de fisioterapia multimodal para coluna cervical com o objetivo de reduzir o sintoma de zumbido3.

O programa de fisioterapia era composto por mobilização manual da coluna cervical, exercícios terapêuticos e exercícios domiciliares. Foram escolhidas tais modalidades por já serem reconhecidas como as melhores práticas baseadas em evidências para o tratamento da coluna cervical3.

Os principais resultados desse estudo apontam para redução significativa e clinicamente relevante de todos os pacientes, em relação às queixas cervicais. Uma grande melhora do zumbido foi percebida em 53% dos pacientes logo após o período de seis semanas de tratamento (2x por semana). Esse resultado foi mantido em 24% dos pacientes após um período de seis semanas do término do tratamento (Follow-up). Essa taxa de sucesso é considerada alta, dadas às características de cronicidade e severidade dos casos de zumbido3.

Apesar de termos vistos aqui eficácia do tratamento fisioterápico em casos de zumbido somatossensorial, devemos ter muito claro que todos os tipos de zumbido devem passar por avaliação realizada por profissional qualificado, pois a modulação somatossensorial do zumbido pode também ser relevante em casos de zumbidos otológicos (patologias do ouvido e vias auditivas)4.

 

Referencia Bibliográficas;

 

  1. Baguley, D., Mcferran, D. & Hall, D. Tinnitus. Lancet 382, (2013).
  2. Wal, A. Van Der et al. Treatment of Somatosensory Tinnitus : A Randomized Controlled Trial Studying the Effect of Orofacial Treatment as Part of a Multidisciplinary Program. (2020). doi:10.3390/jcm9030705
  3. Michiels, S., Heyning, P. Van De, Truijen, S., Hallemans, A. & Hertogh, W. De. Does multi-modal cervical physical therapy improve tinnitus in patients with cervicogenic somatic tinnitus ? Man. Ther. 26, 125–131 (2016).
  4. Sanchez, T. G. & Rocha, C. B. Diagnosis and management of somatosensory tinnitus : review article. 66, 1089–1094 (2011).
  5. Pezzoli, M. et al. Tinnitus and its relationship with muscle tenderness in patients with headache and facial pain. 638–643 (2015). doi:10.1017/S0022215115001425
  6. Hwang, J. H., Tsai, S. J., Liu, T. C., Chen, Y. C., & Lai, J. T. Association of Tinnitus and Other Cochlear Disorders With a History of Migraines. JAMA Otolaryngol. – Head Neck Surg. (2018). doi:10.1001/jamaoto.2018.0939
  7. Langguth, B. et al. Tinnitus and Headache. 2015, (2015).
  8. Langguth, B. Tinnitus Patients with comorbid headaches : The influence of headache Type and laterality on Tinnitus characteristics. 8, 1–8 (2017).
  9. Onishi, E. T. et al. Tinnitus and sound intolerance: evidence and experience of a Brazilian group. Braz. J. Otorhinolaryngol. 84, 135–149 (2018).

 

Fisioterapeuta convidado:

Dr. Raphael Luz ( @raphaelluz23 )

Fisioterapeuta pela IBMR
Pós graduação em Dor pelo Einstein

 

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