A fisioterapia manual pode ser definida como uma abordagem clínica que utiliza técnicas manuais específicas para diagnosticar e tratar as estruturas de tecidos moles e articulares com o propósito de modular a dor e melhorar a função (American Academy of Orthopaedic Manual Physical Theraists, 1999; American Physical Therapy Association, 2001). Embora quase sempre seja igualada as técnicas de manipulação/mobilização, a fisioterapia manual pode incluir uma variedade enorme de técnicas que, em princípio, se direcionam especificamente aos sistemas articular, muscular e neural (Bialosky et al, 2009).
A fisioterapia manual não é uma mera aplicação de técnicas manipulativas para o tratamento de problemas dolorosos, mas um “processo” ou abordagem do paciente/cliente baseado em um raciocínio clínico (Silvernail, 2012). Portanto, a fisioterapia manual cobre não somente os aspectos relacionados ao tratamento (exemplo: mobilização articular), mas também outras questões relacionadas ao manejo do paciente (exemplo: educação, aconselhamento, fatores cognitivos comportamentais), os quais são quase sempre decisivos para os pacientes com dor musculoesquelética (Elvey e O’Sullivan, 2004).
A fundamentação teórica da fisioterapia manual é diversa, tendo sido baseada em diferentes modelos filosóficos de diagnóstico e tratamento. Alguns são baseados em construções incongruentes com escassa credibilidade (Cook, 2008). No entanto, muitos fisioterapeutas manuais continuam ligados pessoalmente e emocionalmente a esses modelos sem validação científica (Cook, 2008). Além dos inúmeros modelos teóricos que dão suporte a fisioterapia manual, sua terminologia não é padronizada. Essa padronização é necessária quando se quer assegurar consistência no cuidado e uma aplicação uniforme e reprodução do tratamento, além de uma transferência dos dados encontrados em pesquisas (Flynn, 2004; Flynn et al, 2008; Mintken, DeRosa; Little et al, 2008; Mc Dowell, Johnson e Hetherington, 2014).
Atualmente, existem inúmeros estudos na literatura que tem demonstrado a sua efetividade no tratamento de vários padrões de dor musculoesquelética, como: lombalgia (Bronfort et al, 2004), dor no ombro (Ho, Sole e Munn, 2009; Brantingham, Cassa et al, 2011; Jain e Sharma, 2014; Camarinos e Marinko, 2009), cervicalgia (Bronfort et al, 2004; Miller et al, 2010; Gross et al, 2010), dor anterior no joelho (Collins et al, 2012) e epicondilalgia lateral (Bisset et al, 2006; Herd e Meserve, 2008; Bisset et al, 2005).
Alguns estudos relacionados a fisioterapia manual, tem focado mais em provar seus efeitos clínicos do que aprofundar em seus mecanismos de ação (Fisher et al, 2009). Portanto, até a presente data, seus mecanismos de ação ainda não estão bem estabelecidos (Bialosky et al, 2009). Uma melhor compreensão desses mecanismos, podem ser essenciais para selecionar corretamente os pacientes que melhor respondam as técnicas (Bialosky et al, 2009). Isto, por sua vez, otimizaria a eficiência, qualidade e os custos do tratamento da dor musculoesquelética. A identificação dos mecanismos de ação traria uma maior aceitação das técnicas de fisioterapia manual e o seu uso mais apropriado pelo profissional (Bialosky et al, 2009).
Historicamente, algumas abordagens terapêuticas manipulativas, tem se baseado em princípios biomecânicos para identificação da disfunção articular e na escolha do tratamento. As técnicas de avaliação, às vezes demasiadamente elaboradas, são ainda utilizadas para determinar disfunções teciduais específicas responsáveis pela dor do paciente de acordo com tais modelos. A seleção subsequente das técnicas de tratamento geralmente depende da escola de pensamento do terapeuta, preferência própria e concepção geral de sua prática (Thomson, Petty e Moore, 2014). A necessidade de escolher uma técnica uma técnica em particular e quase sempre reforçada pelos educadores, que enfatizam a necessidade de escolher a técnica “certa” (em termos de grau, direção, nível segmentar etc.) pode determinar resultados clínicos pobres e tá potencialmente danoso ao paciente.
Uma possível implicação desse tipo de abordagem é que o sucesso da fisioterapia manual depende de uma correção de anormalidades biomecânicas detectadas no exame clínico de acordo com as teorias biomecânicas (Jull e Moore, 2002).
É erroneamente pressuposto um comportamento mecânico seguindo um modelo para as articulações que apresentam uma disfunção, independente das alterações regressivas, pós-traumáticas ou degenerativas, o que é bastante improvável.
A fisioterapia manual evoluiu significativamente nas últimas décadas especialmente devido a dois aspectos críticos: o desenvolvimento de uma prática baseada na evidência e informação e uma revolução causada pelos avanços no estudo da dor. Isso tudo facilitou a aplicação dos procedimentos terapêuticos e diagnósticos com uma abordagem mais centrada no paciente.
O reconhecimento da dor como uma resposta do sistema nervoso central, não necessariamente dependente de uma matriz nociceptiva ativa, e a integração do modelo biopsicossocial vem causando uma certa confusão no cenário clínico. Por exemplo: alguns profissionais têm erroneamente pressuposto que fatores relacionados a patologia são de pequena ou nenhuma importância na tomada de decisão clínica em pacientes com dor (Weiner, 2008; Hancock et al, 2011). Vem ocorrendo uma não comprovada e injustificada crença de que o tratamento baseado na patologia do paciente seria de limitada utilidade clínica e que, tornaria piores os resultados (Deyo et al, 2009; Pransky, Buchbinder e Hayden, 2010).
Os fatores psicossociais são claramente essenciais para a classificação e tratamento dos pacientes com dores crônicas. Todavia, argumentos tentando justificar a exclusão dos fatores anatômico-patológicos nos cenários clínicos e de pesquisa não são compatíveis com a literatura atual (Jull e Moore, 2012; Ford e Hahne, 2013; Hancock et al, 2012).
Paradoxalmente, após a rejeitar a identificação de patologias específicas, o diagnóstico em alguns dos modelos de fisioterapia manual é ainda baseado na identificação de uma fonte tecidual de dor e a sua resposta ao tratamento: o que pode ser chamado de diagnóstico baseado na estrutura. O fisioterapeuta palpa e valia os diferentes tecidos articulares, musculares e neurais responsáveis sem estabelecer um diagnóstico anatômico-patológico e, baseado na resposta nociceptiva desses tecidos, uma categoria diagnóstica é formulada. A escolha e aplicação do tratamento são então guiados pela modificação da resposta da dor (Jull e Moore, 2002).
Os fisioterapeutas que utilizam esse modelo frequentemente selecionam suas técnicas baseando-se em suas preferências pessoais.
Uma das questões ainda não compreendidas seria que, a aplicação das técnicas de fisioterapia manual, são destinadas ao diagnóstico e tratamento das disfunções ou reduções das funções, mas que esses problemas podem ser decorrência das mudanças nas estruturas articulares, que precisam ser interpretadas. Deve ser enfatizado que a disfunção articular não pode ser considerada uma entidade nosológica, mas ao invés disso como um comportamento anormal do movimento articular. As disfunções articulares são quase sempre a expressão de condições patológicas ou mudanças nas articulações intervertebrais. É essencial relacionar o tratamento das disfunções articulares as condições clínicas do paciente. Portanto, as técnicas manuais são meras ferramentas que podem ser efetivas no manejo das disfunções articulares, musculares e neurais; devendo sempre estar correlacionadas com a condição clínica do indivíduo a ser tratado.
Jorge Arrigoni – Equipe Head & Neck Fisioterapia